Alguns
dias atrás postei no Facebook o relato do Márcio que depois de 11 anos explicou
no blog dele porque estava voltando ao Brasil. Você pode ler o relato dele, se
quiser, aqui. Em seguida postei um link sobre uma matéria baseada em
comentários a um outro post sobre o mesmo tópico, "voltar ou não a viver
no Brasil". A maioria das pessoas que comentaram no Facebook do blog
disseram que não concordam com a decisão do Márcio, porém alguns concordaram
com ele. E houve também aqueles que perguntaram a minha opinião sobre o
assunto.
Essa
questão é muito pessoal e é muito difícil tomar uma decisão como essa de voltar
ao Brasil, como também não é fácil tomar a decisão de sair dele. Segundo
pesquisadores e psicólogos, a readaptação no país, é mais difícil do que a
adaptação no país estrangeiro. Deixar para traz a família, amigos e tudo o que
você adquiriu durante uma vida (e que têm valor sentimental) e chegar aqui com
3 malas para começar do zero não é algo fácil. Imagina deixar agora tudo que se
adquiriu no estrangeiro e começar do zero novamente? Mas eu tomei a decisão de
viver em um país estrangeiro e não me arrependo.
Houve
muitas pessoas que me chamaram de louco, de "traidor" e muitas outras
coisas. Até hoje eu recebo mensagens de pessoas que dizem que "brasileiro que é brasileiro fica no
Brasil e luta por um Brasil melhor". Como se sair do país, ou mesmo
deixar de votar, não fosse um ato de protesto pela insatisfação com tudo o que
acontece no nosso país. A verdade é que cada um sabe aonde o calo aperta. E o
que eu vou dizer agora é a minha opinião, nua e crua, mesmo que seja acusado de
"desertor", "preconceituoso", "metido", "deslumbrado",
"portador de síndrome de vira-latas", etc. Na era do
"politicamente" correto, não se pode dizer mais nada sem cair em
desgraça. Por causa disso mesmo é que os americanos perderam Miami para os
cubanos e não podem dizer mais "Feliz Natal" no comércio pois ofende
os que não são cristãos, ateus ou que não celebram o Natal. Por isso encare meu
relato como um desabafo.
Eu
simplesmente não aguentava mais viver
no Brasil. Eu achava que tinha nascido no país errado. Nada do que vou
dizer é novidade, mas o custo de vida, a poluição de SP, o trânsito, o crime, o
desrespeito do brasileiro pelo próximo, o desrespeito do governo para com a
população, a sujeira política, a roubalheira descarada, a facilidade de como se
mente, a polícia, os ladrões, os "Gersons" da vida, os impostos, a
falta de educação (de todas as classes!), a falta de civilidade, a petulância de
alguns dos pais dos meus alunos (era professor de escola privada de alunos de
classe alta), as condições de vida, os preços de tudo, e mais uma longa lista
de coisas faziam a minha vida miserável! Estou sendo sincero, eu
realmente sofria com essas coisas. E por ter conhecido outros 15 países e
ter passado tempo considerável com pessoas de lá, via, a cada viagem como minha
vida era ruim e sofrida no Brasil em comparação com classe média e classe
média baixa desses países. Dos que eu visitei, o Brasil só era melhor que o
Paraguai. E não pense que eu tinha baixo salário no Brasil. Tinha salário alto,
morava em um apartamento em um excelente bairro, tinha carro novo, boas coisas
etc. Mas a que custo?
Só há uma palavra para descrever São Paulo - Caos... |
O
engraçado é que eu ouvi de um professor "socialista" na escola que eu
trabalhava a seguinte frase: "Ué, se alguém não está contente com os
alunos ou com os pais dos alunos, mude de profissão ou mude de escola!".
Embora tenha ficado com raiva dele na época, conclui depois que ele estava
certo. Se trata daquele velho ditado, "não está contente? Se manda!".
No entanto, existe uma exceção, segundo estes. Se for país, não pode. Se
estiver descontente, não pode mudar de país, porque daí você é um fdp".
Eu ainda me pergunto hoje se as pessoas que criticam quem quer sair do Brasil,
realmente pensam assim ou será que há outros sentimentos envolvidos??
Por
estes e outros motivos eu tomei a decisão de ir para o mundo. Ir para outro
país, para estudar, viver, ter novas experiências, etc. Planejei desde 2006 e
em 2009 fiz minha mala e vim morar nos EUA cursando Arquitetura de Interiores
em uma faculdade de Orlando. Foi uma experiência incrível. Mas nem tudo foi
rosas, é claro. Tive que fazer tudo que imigrante faz, trabalhos manuais,
limpeza, pintura e por aí vai até conseguir meus documentos. Mesmo assim nunca
fui discriminado ou mal tratado por quem quer que seja. Aliás, quando
trabalhava para brasileiros como guia turístico, guia de compras, etc fui
maltratado várias vezes.
A maioria dos estudantes e imigrantes trabalham nos primeiro anos com limpeza e este foi o meu caso também. |
No
relato do Márcio, ele cita vários fatores como por exemplo a língua e a
cultura. Com respeito à língua, algumas pessoas não conseguem se tornar
totalmente fluentes e por vários motivos. Muitos sequer aprendem inglês mesmo
vivendo nos EUA por muitos anos. No caso do Márcio, pode ser que em casa eles
falassem português, pode ser que ele, por ser engenheiro, das exastas, não
tenha aptidões como os de humanas têm para com as línguas. E como foi meu caso,
afinal também sou engenheiro? O começo foi difícil na faculdade, no segundo ano
eu já era completamente fluente. A pior parte é quando você não tem o vocabulário
para se expressar em inglês e também já esqueceu como se fala em português. A
idéia fica dentro da cabeça e não sai pra fora de jeito nenhum. Mas com bastante empenho, é possível superar
as barreiras da língua. É possível ficar fluente e ter bem pouco sotaque
(eliminar é impossível, para adultos). Não é minha opinião, é fato científico.
Para mim a língua não é mais nenhum problema.
Quanto
à cultura, ele tem razão, realmente não é a sua. Nós crescemos com um tipo de
comida, música, piadas, humor, histórias, cheiros, cores, personagens,
programas de televisão, etc. A gente sai do Brasil, mas o Brasil não sai da
gente. E isso não é ruim! Seremos sempre brasileiros e eu me orgulho disso.
Não quero renegar a minha cultura e nem sequer esquecê-la. Em casa eu ouço MPB,
assisto novelas brasileiras, programas de humor, Globo Reporter, mini séries,
etc. Eu cozinho pratos brasileiros para americanos e eles adoram. Mas cozinho muitos
pratos que aprendi com os americanos e os brasileiros gostam muito também.
Entendeu o ponto? Não é a sua cultura, mas nada impede de você pegar o que há
de melhor nela e incluir no seu dia a dia. Não é preciso renegar uma cultura e abraçar a outra. Também do mesmo modo, se livrar
de traços da cultura brasileira que não são muito desejáveis e acredite, por mais educado que sejamos, nos pegamos fazendo coisas que não devíamos.
Sim
dá saudades, de muitas coisas. Mas eu penso que as saudades que eu tenho é de
uma vida que não existe mais pra mim no Brasil. Eu mudei e a sociedade
brasileira também. A saudade que eu tenho é de uma vida décadas atrás, é preciso
ter bem consciência disso. Se eu decidisse voltar, não voltaria para aquela
vida de décadas atrás. Voltaria para a vida da época que eu decidi que queria
sair do Brasil! Disso eu não me engano!
Outras
saudades são de coisas que mesmo morando no Brasil eu jamais teria. Saudades de
coisas do passado. Saudades da minha mãe, que faleceu o ano passado.
E
não é balela, nos EUA há mais, e melhores oportunidades do que no Brasil. É
fato cientificamente provado. O índice de desenvolvimento humano nos EUA (IDH, que
mede a facilidade de se conquistar e ter qualidade de vida, como também
oportunidades, índice de pobreza e muitas outras coisas) é o quinto no mundo. O
Brasil é o 88º. Atrás até de Portugal, Chile, Argentina e muitos outros países
mais pobres que o Brasil. No Brasil tudo é difícil, infelizmente. Não me leve a
mal, aqui também há seus problemas e até alguns absurdos! Mas em escala muito
menor.
O Brasil nem se encontra entre os 50 primeiros. Mesmo tendo PIB muito maior que muitos outros países. |
Se
me perguntarem seu eu voltarei a morar no Brasil eu digo sinceramente que
acredito que não. Eu não consigo mais viver no Brasil. Das vezes que eu fui
visitar, depois de alguns dias já queria voltar "para casa". Sim aqui
é a minha casa. A nossa casa é aonde o nosso coração está. No caso do Márcio, o
coração dele não saiu do Brasil. Eu gosto muito da vida que eu tenho nos EUA.
Eu gosto da organização. Eu gosto da educação da grande maioria das pessoas. Eu
gosto das minhas janelas sem grades, do jardim da frente da minha casa sem
muros, dos meus vizinhos. Eu gosto da natureza de Orlando, das dezenas de
passarinhos, esquilos, e outros bichos que vêm comer e fazer ninhos no meu
quintal. Eu gosto do silêncio e respeito da vizinhança, depois das 10 horas na
noite. De dormir sem ouvir nenhum barulho. Eu gosto do respeito no trânsito
(nunca vi um acidente de trânsito em 5 anos, só na televisão). Eu gosto de ir
ao supermercado com 100 dólares e trazer 4 grandes sacolas cheias de coisas. Eu
gosto do fato de que não sinto medo quando ando nas ruas, quando entro e saio
do carro, quando vem uma moto em minha direção. Eu gosto de ver o quanto eu
pago de impostos em cada compra e ver que, nos ítens de alimentação (leite,
ovos, batata, legumes, arroz, etc) o imposto é ZERO. O imposto da gasolina
também é zero. Eu gosto de ver o quão devagar os carros trafegam pelas ruas
residenciais e que todos páram no sinal do stop. E ver que, em um cruzamento de
4 vias, sem semáforo, todos páram e cada um sai na mesma ordem que chegou, sem
auxílio nem mesmo de guardas de trânsito e ninguém se confunde ou fura a fila.
Eu gosto de andar de bicicleta e ver que os carros ao passarem por mim reduzem
a velocidade e dão a distância de 1,5m. E que as pessoas ao me cruzarem,
cumprimentam sem nem mesmo me conhecer. Eu gosto de ver meus vizinhos nos
finais de semana cortando suas gramas e cuidando da aparência externa de suas
casas (embora por dentro a gente sabe que é diferente). Eu gosto de ir aos
restaurantes de Orlando e sempre ser servido com um sorriso por um atendente
americano. Eu gosto do fato de não ver animais abandonados nas ruas já por
quase 6 anos. Eu gosto de ver o cuidado que os americanos têm com seus
cachorros e gatos. Quase não há cachorros soltos no quintal. Todos querem ter
seus melhores amigos dentro de casa com eles, longe do calor escaldante ou do
frio intenso. Eu gosto de ver crimes sendo solucionados (a estatística é de
90%). Eu gosto de ver criminosos, independente da classe social, ir para a
cadeia pagar pelo que fez. Eu gosto do respeito do americano pelas leis. Eu
gosto da qualidade das construções e do acabamento das casas nos EUA. De quanto
conforto térmico, acústico, etc, se tem dentro delas. E que pessoas de classe
média baixa e pobres podem ter conforto também! Eu gosto do cuidado que a
prefeitura teve em fazer sarjetas arredondadas para que os carros não risquem
as rodas nelas. Eu gosto da velocidade da internet e do telefone 4G. Eu gosto
da confiança que o governo dispensa à população enviando a placa do carro pelo
correio para que você mesmo parafuse no carro. Eu gosto do fato de que a
palavra do cidadão tem valor até que se prove ao contrário. Você diz "foi
assim" e todos acreditam. Eu gosto de não ter medo da polícia e eu sorrio
quando vejo uma pessoa negra em uma Mercedez, BMW ou Audi (e é bem comum), pois
eu percebo que os afro-americanos têm mais oportunidades aqui. Eu gosto de
viver aqui. Eu sou feliz aqui. Poucas coisas me incomodam.
Em pequenas coisas podemos ver consideração. A grande maioria das sarjetas são arredondadas para evitar acidentes e para que os carros não risquem suas rodas |
Sua casa é onde seu coração está |
Antes
que alguém diga alguma coisa sem sequer me conhecer, leia o blog, que todos os
defeitos dos EUA estão escritos aqui. Os EUA não é um país perfeito, nem todo bairro
é igual ao meu, há crimes, há gente doida, injustiças, etc, etc, etc e eu já
escrevi muito sobre isso, em vários posts. Mas nada se compara a situação atual
do Brasil, que me deixa muito triste pois eu tenho família e amigos lá.
Além do que eu acredito que, o povo brasileiro é único e maravilhoso, amistoso
e muitas outras qualidades e fico triste que tenham que sofrer. No entanto,
basta um Carnaval, uma Copa, um campeonato brasileiro para que esqueçam de
tudo isso... e idolatrem um estúpido que disse que "copa não se faz com
hospitais".
Eu
me adaptei tanto nos EUA que não conseguiria mais me adaptar com as condições
do Brasil. Isso é bem claro pra mim. Eu sei que eu tenho saudades de coisas que
não existem mais. Como um antigo relacionamento, eu sei que tenho saudades das
coisas boas, mas lembro bem como era um inferno (pra mim) conviver com a pessoa
no dia a dia. No entanto, nunca vou deixar (e nem quero) de ser brasileiro.
Nunca vou deixar de amar a minha cultura, meu povo, minha terra. Só não dá mais
para morar lá. Eu amo o Brasil, mas infelizmente, meu amor não era correspondido...
O
meu conselho é: Se a vida é muito boa no Brasil, fique no Brasil. Se a vida é
ruim, tente melhorá-la! Trabalhe mais, estude à noite, mude de emprego, aprenda
línguas e se, depois de tudo isso, a pessoa ainda se sentir mal, procure outro
lugar onde se possa viver melhor e ser feliz. Todos somos cidadãos do planeta Terra. Por causa dessa merda de patriotismo é que o mundo tem tantas guerras.
Boas ações podem ser feitas em qualquer país em que se viva. Nossos avós e bisavós
também deixaram suas pátrias e ninguém critica isso. E eu vou dizer pela décima
vez: "O mundo é muito grande para se nascer e morrer no mesmo lugar".
Foto em minha casa, com meus cachorros Dexter e Annabel recebendo clientes brasileiros que se tornaram amigos ;-) |