Essa não é a Flavia! :) |
Uma de minhas melhores amigas e colega de trabalho, a professora de educação física Dani Tonioli tem uma irmã que vive em Miami. Eu sempre tive muita curiosidade de conversar com ela e saber detalhes da vida nos EUA, fofocas, qualquer coisa. Nas vésperas de vir aos EUA nos encontramos no apartamento da Dani, mas conversar sobre os EUA não foi possível. Por isso, correspondendo-me com ela por meio de correio eletrônico eu perguntei se ela estaria disposta a dar uma entrevista para o blog e ela topou. Por conta de sua vida agitadíssima ela respondeu às minhas perguntas 6 meses depois! Mas como tudo que ‘tarda mas não falha’ ela respondeu e aqui vai a entrevista na íntegra. Flávia é uma pessoa reservada e não quis que sua foto ou email fossem publicados no blog.
Para responder ao questionário que eu enviei, segundo Flávia, ela teve que parar tudo, trabalhos, papers para leitura da pós graduação, desligar o telefone, desconectar a internet , mandar o chefe arrentino para arrentina e um pouquinho mais. Valeu a espera!
Nome completo: Flavia Tonioli
Idade (se nao quiser nao precisa falar! :P): Forever 25!
Formação no Brasil: Oceanografia
Nome da faculdade: Univali
Atividade que desempenhava no Brasil: Monitoramento de recifes de corais.
Flávia, quando foi que chegou aos EUA e qual o objetivo?
Primeiro em 2004 como pesquisadora visitante, vim para ver como seria trabalhar aqui e também para tentar uma bolsa de estudos futuramente. E depois em 2006, retornei, com minha bolsa de estudos integral, para começar o mestrado. O objetivo em 2006 era fazer mestrado e construir minha carreira.
Como foi que você conseguiu uma bolsa para estudar nos EUA?
Ralei como uma condenada em vários projetos, entrevistando turistas e stakeholders (pescadores, mergulhadores, managers, galera da área de turismo, etc. E não pense você que entrevistar pessoas de mal humor é fácil não, ainda mais quando os questionários são longos!), compilando e analisando database, ganhando praticamente nada. Convenci meu chefe que ninguém conseguia trabalhar tanto quanto eu, debaixo de 40ºC, chuva ou furacões, sempre com um sorriso na cara e fazendo piadinhas das furadas que me metia. Um ano depois, ele se convenceu que eu seria boa para o trabalho e me deu uma bolsa, em troca de escravidão à pesquisa por 2 anos.
Onde você ficou morando assim que chegou aos EUA? É caro viver nos EUA?
Em 2004 com 3 estudantes brasileiros, na sala deles, num colchão inflável.
Em 2006 aluguei meu Studio (apto com quase tudo em um só cômodo e um banheiro) , que para vida de estudante bolsista era bem caro, $850, mas como eu não tinha carro, então minha bike aliviava o bolso.
É caro, se você vive em um lugar bom (localização custa $$), tem carro (seguro mais gasolina), se gosta de comer fora (eu sempre odiei cozinhar, mas tem horas na vida que uma garrafa de vinho te transforma num mestre cuca!) e se gosta de consumir (mas é para alegria dos pobres queexiste TJ MAXX, Costco, Dolphin Mall, Wal Mart, Sawgrass Mall, Ross, Marshalls e outras lojas que te permitem consumir, mas que também podem te levar a falência se você for um shopaholic ).
Eu vivia o mais simples possível, não comia muito fora e nunca comprava nada.
Pouco dinheiro e sacola cheia!! |
Os primeiros dias de aula foram ok, até eu ter aula com um Porto-riquenho que não entendia absolutamente nada do que ele falava, mas até o final do semestre consegui me comunicar com ele (em espanhol rs). Não! Brincadeira, conseguimos nos entender na língua universal.
Preconceito teve bastante quando eu comecei a tirar notas mais altas que os americanos. Eu me empenhava bastante nas apresentações e os professores sempre elogiavam, isso criou um ciuminhos de alguns alunos nerds, que sempre faziam perguntas relacionadas a minha escrita (se eu tivesse escrito algo errado em inglês) ao invés de perguntar sobre a matéria. Mas acho que foi mais coisa de competitividade (que americano tem bastante), e de nerd, do que de preconceito.
Lá vem o aquele vermelhinho... |
Os meus foram legais, a maioria não eram americanos e entendiam bem pelo o que eu estava passando. Os americanos acho que me achavam meio louca. Mas tirando acima de B, tá valendo não é?
Quais diferenças existem entre uma faculdade americana e uma brasileira?
O meu mestrado aqui foi mais puxado que minha faculdade e pós-graduação no Brasil. Os professores não estão muito aí para você e deadline é deadline, não tem o jeitinho brasileiro de que o cachorro morreu e você não pôde entregar a lição e trabalhos a tempo. Também não tinha muita amizade entre professores e alunos. Mas eu tinha uns professores alternativos que se comunicam bastante com alunos e ate faziam reuniões na casa deles.
E em termos de amizades, também não fiz muitas na faculdade no meu curso, com alunos. Tudo era bem competitivo e professional, sem muita amizade de verdade. Acho que falo mais com meus professores do que com meus colegas de classe. Também fiz amigos na faculdade mas fora do meu curso. Os do meu curso, foram poucos que fiz amizade mesmo.
É difícil estudar nos EUA? Como você descreveria a sua experiência?
Acho que se você tem uma base boa de inglês, pega rápido. Acho que o começo é meio sofrido, mas depois você se acostuma. Eu, como estava trabalhando também, limitava bastante meu tempo de estudo, então eu tive que aprender a escanear papers e aprender de forma mais rápida.
Quais foram os principais desafios que você teve que enfrentar nesse período?
Eu acredito que Miami não é uma cidade muito friendly, e a falta de amigos e família, é o que realmente te desanima. Eu sempre tive muito foco na minha profissão, então sabia que teria que passar por isso, sozinha, para crescer profissionalmente. Mas skype ajuda muito, um beijo pro criador do skype!!! A falta de grana também pesa, porque na terra do tio Sam o que te move é o capitalismo, e se você não pode comprar, você
se exclui um pouco da população. A comidinha de casa realmente faz falta.
Desafio também foi procurar emprego não tendo um green card ou não sendo US citizen. Acabei sempre trabalhando para estrangeiros. Só uma vez tive uma chefinha americana, os outros, indiano, filipino, argentino, ... É bem difícil alguém te dar emprego quando você está concorrendo com pessoas que tem as mesmas qualificações que você e não precisam de visto. Na minha área, que a grana é curta, dificulta bastante.
Outro desafio é mostrar que seu inglês é bom suficiente, mesmo com nosso sotaquezinho e trocando as palavras,...
Você já respondeu que trabalhava enquanto fazia faculdade. Que tipo de trabalho fazia? Pode dizer a remuneração?
Sim, trabalhava em vários projetos diferentes para o meu chefe e ainda pegava bico com outros professores, fazendo entrevistas, compilando ou analisando database, fazendo mapas, o que eles precisavam de ajuda, eu
aprendia e fazia. Cheguei até a trabalhar de final de semana em provas de corrida, dando amostras de accelerade. Tudo quanto era bico que aparecia eu pegava.
Vai um acelerade aí? (Gente o que é isso hein?) |
Agora eu gosto, porque sou casada, ganhei uma american family, e tenho meus amigões brazucas aqui. Através do triathlon fiz vários amigos brasileiros que viraram minha família aqui. Então, quando eu não estou
preguiçosa ou muito busy(ocupada), treino e trabalho durante a semana. Eu e meu marido, sempre vamos aos jogos de basket do Miami Heat, embora eu seja uma Celtics fã! E sempre cozinhamos em casa, dá pra economizar bastante cozinhando em casa. Meu marido é quase um chefe :P
O que eu mais gosto de Miami é de ver o mar todos os dias, de mesmo ganhando pouco, poder ter acesso a coisas boas, como viver de frente para o mar, ter segurança e poder treinar tranquilamente sabendo que ninguém vai roubar minha bike. Também amo sair de barco, mergulhar e pescar. Ahhh, e outra coisa que é legal daqui, bateu uma saudade da comidinha brazuca, tem vários restaurantes e lojinhas brazucas, o que você não acha com tanta freqüência em muitos outros lugares.
Miami Beach é o máximo! |
Prédios do Downtown Miami. |
Você acabou casando com um americano. As diferenças culturais entre vocês influenciam no casamento?
Claro que ha muitas diferenças culturais. Outro dia eu quase matei ele porque ele colocou a panela com todo aquele restinho de brigadeiro de molho. DE MOLHO????? Tá maluco???? Não existe coisa melhor do que raspar uma panela de brigadeiro. Outra, ir a um churrasco e só levar o quanto você vai beber, eu levo bebida para a galera e não pensando em quantas brejas vou tomar...
Natal aqui nessa terra é uma derrota, volta pro Brasil, que aqui é deprê.
Americano é bem certinho, segue as regras ao pé da letra, mas acho que é por isso que as coisas funcionam aqui.
Diferenças sempre existirão, mas como tudo na vida, você aprende a ceder e entender, e aos poucos também vai aprendendo mais sobre a cultura deles, e dançando conforme a música... Ou faz eles sambarem também :)
Diversidade da população que vive nos EUA. |
Sim, quero muito que meu marido aprenda português e minha cultura. Ele também quer. Ele ama o Brasil e fica encantado com a forma que os brasileiros vivem, pessoas sempre alegres, muitos, felizes com pouco. A
única coisa que pega é minha profissão, grana, porque para morar no Brasil como moramos aqui, tem que ter muito $$$$, e segurança também acaba custando caro em algumas partes do Brasil. Isso é uma coisa que sempre me faz querer voltar, poder dormir de porta destrancada, deixar minha bike no carro, andar com meu laptop na minha mochila pedalando...
Quais são seus planos para o futuro?
“Deixa a vida me levar, vida leva eu...” Como já dizia o grande mestre Zeca Pagodinho. Ummmmm dia, fazer meu PhD, continuar sempre aprimorando, fazendo cursos, estudando (o que aqui é bem caro), e continuar crescendo profissionalmente. Viajar mais, isso é outra coisa boa de Miami e EUA, que viajar daqui é bem mais barato do que viajar de muitos outros lugares.
Abraços a todos no Brasil!
Flávia Tonioli
Fotos sem direitos autorais extraídas de mybrainstorm.com
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