Por 2 semanas eu estive em SP para
visitar minha família depois de 3 anos e 4 meses que estou nos EUA. Preciso
confessar uma coisa. Quando meu pai me disse para comprar a passagem eu não
estava nem um pouco com vontade de ir para o Brasil. As notícias que vejo na
internet me fazem ficar com "receio" de visitar o Brasil. Uma vez lá
em SP o receio já tinha passado e eu fiquei muito contente de ver minha família
e amigos, muitos dos quais, nem pela internet eu tinha contato. Muitos não teem Facebook ou mesmo MSN. Ir na escola que eu trabalhei por 7 anos foi muito
emocionante. A coordenadora da escola me agarrou e não me soltava. Me levou
para a sala dos professores onde abracei os antigos colegas e amigos e de
repente, a sala estava lotada com ex-alunos, todos querendo abraçar o antigo
professor. Fiquei emocionado com a recepção. A gente não tem noção do quanto
influencia a vida das pessoas.
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Alunos e professores na recepção que fizeram pra mim no Bar Genuíno na Vila Mariana |
Eu acho que cada um de nós vê o que quer
em qualquer situação, não concorda? Por exemplo, eu conheço gente que só vê os
aspectos bons do Brasil e "escolhe" ignorar todo o resto. Gente que
só vê o que há de ruim nos EUA e "escolhe" desconsiderar todo o
resto. Nesses 15 dias vi gente assim, mas eu estava disposto e aberto a ver o
bom, o mau, o bonito e o feio. A pergunta que mais ouvi de todos foi: "E
aí? Lá é melhor que aqui?". Pergunta difícil de responder embora isso seja
bem claro na minha mente. Difícil porque se eu dissesse que é melhor estaria
mentindo. É melhor em alguns aspectos e pior em outros. E se dissesse que é pior, percebi que alguns ficariam ofendidos.
Também não queria dar uma de "metido" porque eu sei que muitas
pessoas gostariam de viver em um lugar melhor mas simplesmente não teem essa
opção como eu não tive por muitos anos.
Se eu fosse descrever SP com uma
palavra essa seria a escolhida: "Caos". São Paulo tem quase 1,5
milhão de carros a mais de quando saí de lá em 2009. O trânsito piorou
drasticamente e não vejo solução ou melhora para a situação. O número de
motoqueiros duplicou pelo que pesquisei. Antigamente eles eram até educados
quando você abria passagem. Agradeciam, businavam, faziam sinal com a mão. Hoje
se você não sai do caminho gritam, chutam seu espelho (o que aconteceu comigo).
Fazia 3 anos que não via acidentes (nunca vi um em Orlando, embora haja acidentes, é claro). Em São Paulo, em
15 dias, vi 3 acidentes e pessoas mortas deitadas no meio da rua, o que pra mim
foi chocante. Eu não escolhi ver isso, simplesmente isso apareceu na minha frente. A agressividade dos motoristas no trânsito de SP é incomum. De cara percebi que meu jeito de dirigir aqui nos EUA não me levaria a lugar nenhum em SP. Mesmo porque é raro quando alguém lhe dá passagem. É preciso mesmo, enfiar o carro e seja o que Deus quiser!
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Invasão de motoboys no trânsito de SP |
Qualquer lugar que se decide ir em São
Paulo, é 1 ou 2 horas de trânsito. Até desanimava, pensar que tinha que ficar
sentado dentro do carro por tanto tempo. Em 15 dias passei mais horas no trânsito do que em 3 anos em Orlando. Lugar para estacionar era o próximo
problema. Estacionamentos caríssimos. Um almoço na Paulista com minha amiga
Rose e família saiu por 72 reais, sendo que desses 35 foram só 3 horas de
estacionamento. O resto foi gasto com um prato de comida e uma sobremesa, sem
bebida (que meus amigos pagaram pra mim. Obrigado Rose, Fernando e Anelize!). Aliás, os preços no Brasil subiram demais e eu tenho a impressão, pelas
pessoas que conversei, que os salários não acompanharam. No bar Genuíno na Vila
Mariana, onde amigos fizeram uma festa pra mim, gastei 46 reais em um pequeno
sanduíche, um refrigerante e um chop pequeno. Quase caí de costas quando o
caixa disse 46 reais. Outro inconveniente foi o fato de o bar fazer somente uma
comanda para a mesa inteira. Segundo a gerência, comandas individuais não eram
mais aceitas, porque as pessoas saíam sem pagar. Então todos tiveram que anotar
em um papel o que consumiram e no final foi um pé no saco difícil
arrecadar a quantia exata de cada um, parte por causa do troco. Passeando no
Shopping Morumbi em busca de algumas lembranças, saí de lá de mãos vazias
porque me neguei a pagar por coisas que realmente não valem. Não vi nada que
valesse a pena, por menos de 75 reais. Tênis custando 1000 reais. Ovos de
páscoa (de 5kg) por 975. Comprei depois um de 400gr por 42 reais na Cacau Show.
E nem vou comentar os preços dos imóveis, que na minha opinião ficaram
imcompráveis. Sorte de quem comprou há 10 anos. Minha amiga pagou por um
apartamentdo de 120 metros quadrados na Vila Mariana em 2005, 350 mil e vendeu
no mês passado por 1 milhão. Um milhão?? Com certeza meu antigo salário no
Brasil (que não era ruim) e que segundo meus colegas, aumentou 5% em 4 anos,
não daria mais pra manter o padrão de vida que eu tinha.
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Não interessa que é da Kopenhagen. Um ovo de chocolate por 1000 reais é um absurdo. |
Engraçado que com 99% das pessoas que
conversei, um insatisfação geral era percebida. As notícias não ajudavam
também. Os irmãos Cravinhos (assassinos) libertados da prisão (veja aqui),
os políticos do mensalão fora da cadeia. O presidente da comissão de Direitos Humanos,
Feliciano (racista e homofóbico) falando que "negros são amaldiçoados e a
Bíblia é quem falou", pode? Uma pessoa neste posto, se falasse uma coisa
dessas aqui se "aposentava" no dia seguinte. Percebi também, sem
querer ofender ninguém, uma sociedade atrasada. Piadinhas sobre homossexuais se
vê em todo lugar. Nas conversas, na TV (nos programas de humor), no Facebook. Ainda é uma coisa
"que não se pode falar abertamente" segundo um amigo meu me disse em um café que tomamos em um bar. "As pessoas sabem, mas não querem ouvir. Existe
ainda muito preconceito" ele disse. Aqui também existe, mas não nesta dimensão. Fiquei
chocado com o programa "Mulheres Ricas". Embora copiado do americano
"The Real Housewives" o conteúdo é completamente diferente. Enquanto
no programa aqui elas tentam se passar por boazinhas (e a gente sabe que não
são), no programa brasileiro elas fazem e falam o que querem. Menosprezam e fazem
piada das classes inferiores, ostentam de forma ofensiva, "jogam água na
areia em um país de sedentos", e o povo gosta.
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Apartamento do meu irmão André no Morumbi. Muros de 30 metros de altura "protegem" os moradores da violência de SP. |
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Quem tem dinheiro, protege-se como pode :( |
Vi e ouvi muitas outras más notícias
que dariam para escrever um livro como aumento da violência em SP bateu record,
prejuízo de empresas famososas, a fábula que a Dilma e comitiva gastou para ver a posse do Papa com dinheiro do povo, etc, etc, etc. Vi um número incrivelmente triste de cachorros nas ruas, o que me fez muito mal. Notícias boas também ouvi como
por exemplo, os novos direitos das empregadas domésticas. Uma vitória para essa
classe que tanto trabalha em São Paulo.
Passar dois dias no interior com a minha mãe foi um alívio da loucura de SP. Águas de Santa Bárbara é linda, tem uma beleza natural maravilhosa. Vi até um Tucano, acredita? Lembrei da minha infância nessa cidade e como fui feliz, solto, livre sem medo de assalto, vivendo em uma casa.
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Quantas vezes desci esse rio em bóias feitas de camara de trator! O percurso é de 3 horas até a cidade... |
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A mamãe!! |
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Balneário de Águas de Santa Bárbara |
Nem tudo foi negativo, é claro. Eu sou
brasileiro e quando me irrito por causa das condições da minha cidade e do meu
país, isso é evidência de que amo meu povo. Se não, porque então ficaria
contrariado? Amo mas não sou cego. E acho que ver e reclamar é dever de todos
os cidadãos. Algumas das boas experiências da minha viagem foi conversar com
estranhos (algo que não se faz muito por aqui). Nós temos o povo mais amistoso
do planeta e eu posso dizer isso pois já estive em muitos países. As pessoas em
geral são gentis e sorridentes, conversa-se com qualquer um em qualquer lugar.
Outra coisa foi notar como a nossa gente é bonita e magra! A única pessoa obesa que vi foi a Mama Brusqueta na gravação do programa Mulheres que fui com o André. Achei nossa gente um pouco mal educada, quando se fala
de "fila" ou respeito pelo espaço do outro. Neste sentido estou mais
acostumado aqui. No aeroporto de SP pessoas cortavam a minha frente, me
empurraram, bateram com o carrinho no meu calcanhar e nem sequer pediram
licença ou desculparam-se.
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Meu irmão Chefe André se preparando para a gravação. Ele vai de 15 em 15 dias apresentar um prato no programa Mulheres da Gazeta. A próxima vez é nesta segunda feira |
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A Kátia é um amor de pessoa!! |
Por essas e outras eu voltei com um
misto de emoções. Queria que o meu país fosse mais educado, respeitasse os
direitos de todos sem exceção, fosse limpo, tivesse preços justos e qualidade de
vida para todos. Fiquei alegre e triste ao mesmo tempo. Adorei ver amigos e
parentes. Meus pais, irmãos, tios, sobrinhos, cunhadas e outros. Estou até agora sem saber se meu
desejo era o de viver perto dessas pessoas no Brasil ou se queria que todos se
mudassem pra cá. Já nos últimos dias ansiava a traquilidade de Orlando. O ar
despoluído, o trânsito fácil, a vegetação, os bichos, os pássaros no meu
quintal. Principalmente, todos os que amo aqui também, família, amigos e meus
dois cachorros, Annabelle e Dexter. Hoje estou quebrado depois da faxina de ontem,
de desarrumar as malas e de cuidar dos cachorros. Mas, à medida que olho pelas
janelas sem grades da minha casa e vejo o gramado banhado pelo sol da Flórida, as casas sem muros e cercas eletrificadas, os esquilos, a limpeza das ruas, penso que aqui é meu lugar por enquanto. O
futuro quem pode dizer?